terça-feira, 25 de maio de 2010

Mutação genética confere protecção contra HIV

A descoberta foi descrita na revista Nature
Uma mutação genética que pode causar doenças auto-imunes como a diabetes tipo 1 confere aos seus portadores uma inusitada vantagem: os seus organismos passam a combater o HIV. Cientistas acabam de revelar o mecanismo por trás desse fenómeno, abrindo um nova frente na tentativa de criar uma vacina contra a Sida. A descoberta, descrita num estudo na revista Nature, é fruto de um trabalho conduzido por cientistas da Universidade Harvard e do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts). O grupo descreve como usou uma ampla estratégia, que incluiu uma simulação do sistema imunológico por computador e testes genéticos em pacientes, para obter os seus resultados. A mutação estudada pelos cientistas é identificada pela sigla HLA B57. Esta faz com que os linfócitos, células de defesa do sangue, actuem de forma mais abrangente. Estes são capazes de capturar vírus que sofreram mudanças e poderiam passar despercebidos pelo sistema imune. A vantagem da mutação por si só já era conhecida. Mas, sem saber o seu mecanismo de acção, os cientistas não tinham como tentar fazer uma vacina que imitasse essa estratégia. No novo estudo, porém, os investigadores mostram como a HLA B57 induz a produção de linfócitos que reconhecem e atacam até mesmo o HIV «disfarçado». O truque para o linfócito com a mutação reconhecer o HIV é que, em vez de fazer a busca usando um conjunto grande de características do vírus, ele identifica-o usando só um pequeno pedaço das proteínas que o recobrem - um peptídeo. Ao simplificar o processo, o sistema imune corre o risco de atacar células do próprio organismo, causando doenças. Mas, em compensação, ele não deixa de atacar o HIV porque o vírus mudou só um pedaço da sua enorme casca de proteínas. Normalmente, os linfócitos que agem como polícias «paranóicos» - são destruídos pelo organismo. Nos pacientes com a HLA B57, porém, eles são livres para agir, porque não saem à caça dos vírus carregando uma lista grande de características, evitando um pouco o excesso de ataques a «inocentes». Para comprovar a teoria, os investigadores fizeram testes de ADN em pacientes portadores de genes com características similares ao HLA B57. Neste grupo, aqueles que haviam contraído o HIV dificilmente desenvolviam a doença. Quase 2.000 pessoas foram avaliadas no trabalho. Segundo Bruce Walker, um dos líderes do estudo, a descoberta levou tempo porque necessitou que um grande conhecimento sobre a estratégia de acção do vírus se acumulasse. «O HIV está a revelar-se aos poucos», disse, em comunicado à imprensa. «Isso é mais um ponto a favor da luta contra o vírus, mas ainda temos um longo caminho pela frente.» O trabalho dos cientistas recebeu um elogio público de David Baltimore, Prémio Nobel de Medicina de 1975, que hoje estuda HIV e imunologia. «Este é um estudo notável porque parte de uma observação clínica, integra-a a observações experimentais, gera um modelo [hipótese] validável e deriva deste um profundo entendimento sobre o comportamento do sistema imune humano», escreveu o cientista. Mas esses anticorpos, em vez de combater o vírus, na realidade ajudam-no a infectar as células. Uma vez identificados, o seu uso deveria ser evitado no desenvolvimento de uma vacina para neutralizar o vírus, assinalam. Conforme Gabin Screaton, director do Departamento de Medicina do Imperial College, a pesquisa proporcionou algumas chaves indicando o que pode ou não funcionar no combate contra o vírus. «Esperamos que os resultados da nossa pesquisa aproximem os cientistas da criação de uma vacina efectiva» contra o vírus, acrescentou.